domingo, 22 de agosto de 2010

Anticomputador – Núbia Marques

Chega -te a mim
Foge do desatino eletrônico
Não tenho braços biônicos
Nem sou metralhadora estridente
Nem aço aninha-se em meus dentes
Não tenho asséptico odor de hortelã
Nem absurdo som do opaco níquel
Não sou herói de batalhas inúteis
Nem deserta mulher do desencontro
Não sou o acaso da procura
Nem a definitiva espera do desespero
Vim do abandono das estradas
Do apátrida em rumo universal
Sou lúcido contato sem metálicos botões de comando
Chega-te a mim
Que sou filha da cópula
Tessitura sísmica da beleza
Não sou filha das provetas
Não sou egressa da inseminação artificial
Sou de vísceras e sonhos
Deambulando cismática
cisandino – voador de simbióticas baladas
Chega-te a mim
Não tenho no corpo precisão de máquinas e robôs
Mas repulsa e imune automação
De amor nos cubículos dos motéis pelas estradas
Onde o rumor de veículos
E gemidos de amor
São bip bip de motores
Mentores fluxos da solidão dilacerada
Chega -te a mim
Traze teu hálito de humo e orvalho
Teus cabelos de madrugada
Teu peito nu desarmado
Teus pés pincelados pela poeira dos caminhos
Tua pretensa ilusão desmaiada no éter
Teu descuido silencioso e sensual
Teu quase-medo espanto
Intimidade tranqüila da loucura
Chega-te a mim
E juntos repudiaremos a hora marcada
O encontro marcado
Os homens marcados
As marcas acrílicas do século XX
E, sem a precisão dos relógios
Na densa e baça manhã que nos cerca
Entre brandos arbustos e sonolentas feras
Gestaremos a liberdade
Chega-te a mim...

domingo, 8 de agosto de 2010

Pequeno prólogo crítico...



Uma das maiores lutas das ciências sociais, sobretudo da Geografia é explicitar o seu verdadeiro foco, o seu objeto de análise, que muitas vezes é permeado pelo senso comum. Durante muitos anos a Geografia padeceu pelo estigma de "ciência militar de localização" restrita à cartografia e a elaboração de mapas, sujeita aos mais variados fins por não assumir nenhum posicionamento ideológico. Algum tempo depois o conceito de matéria decorativa rechaçou a Geografia a partir dos ambientes escolares, disseminando a idéia de que a mesma prescinde alguma interação ou criticidade para a sua plena compreensão.
Devemos conceber a Geografia como uma ciência humana cujo principal objetivo é observar as relações de cada indivíduo com o meio social e a natureza, más não de forma positivista, pré-determinada ou com funções já estabelecidas por um "espírito social", afinal, o que é sociedade senão um grupo de indivíduos? portanto nós somos a base da sociedade, que atualmente molda-se de acordo com os metamorfismos do capitalismo modista que promove uma verdadeira lavagem cerebral nos filhos da alienação.
Porém o papel da Geografia não deve restringir-se a observação, a contemplação de fatos sociais como se propõem algumas "ciências", pois isso é apenas brincar de arte com a ciência, o que eu chamo (com o perdão do termo) de "Masturbação intelectual".
A Geografia deve cada vez mais assumir uma postura parcial e um olhar crítico sobre as armadilhas desta sociedade capitulada, identificando suas armadilhas travestidas de modernidade que instigam a formação de um "não-pensamento comum", pois ela não precisa de pensadores, só de consumidores. Numa metáfora simplista a Geografia moderna, melhor dizendo, a Geografia justa serve como lentes que embora opacas e sujas pela opressão do não-saber, quando limpas e polidas pelo senso crítico lhe faz enxergar longe e, sobretudo nítido.